Paulo Brossard nasceu em 1924. No dia 23 de outubro ocorreu seu centenário. Esta é uma data que marca o momento de relembrar sua vida gloriosa, pelo que serviu ao Brasil, e homenagear a memória de um dos maiores políticos e oradores de nossa história parlamentar.
Conheci Paulo Brossard em 1975 quando ele chegou ao Senado Federal e eu estava na metade do meu primeiro mandato de senador pelo Maranhão. Vi logo tratar-se de um intelectual. Já fora consagrado no Rio Grande do Sul como professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, afamado advogado, estudioso do direito, e era respeitado como grande jurista.
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Durante três mandatos, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, com seu brilho e sua correção, atuando no Partido Libertador — o mesmo de Raul Pilla, que também fora meu colega e que defendia intransigentemente o parlamentarismo —, impusera a todos um grande respeito. Logo foi reconhecido como grande político. Esta era sua vocação maior. Vindo o regime militar de 1964, com a deposição do Jango Goulart, surgiu a oportunidade de Brossard levantar a bandeira da defesa da democracia e da volta do Estado de Direito, ao mesmo tempo em que defendia os perseguidos, cassados e demitidos pelo regime de exceção que se instalara no País.
Filiou-se ao MDB, foi eleito deputado federal e, pelo seu valor e sua expressão política, vice-presidente nacional do Partido. Em 1978 disputou a vice-presidência da República na chapa com o General Euler Bentes Monteiro, que perdeu a eleição para o General João Batista Figueiredo.
Brossard logo se afirmou como grande líder da Oposição, junto a Ulysses Guimarães. Mas não era só isso que o faria entrar para a História do Parlamento: revelou-se como um grande orador, dos maiores que teve o Parlamento brasileiro, ao lado de Rui Barbosa, Gomes de Castro, Joaquim Nabuco, Carlos Lacerda e alguns mais. No Senado eu o ouvi — algumas vezes com ele debati — e pude testemunhar alguns dos seus notáveis discursos.
Tive a felicidade de ser seu amigo e com ele, Luís Vianna Filho, Teotônio Vilela, Gustavo Capanema, fizemos um grupo que toda tarde, após as sessões do Senado, se reunia no Gabinete de Luís Viana para discutir reformas e teorias políticas, os problemas nacionais e literatura. O Senado ainda podia orgulhar-se de ouvir reflexões maiores de homens de todos os partidos e de ideias diferentes. Era o diálogo e a convivência que hoje cobram dos políticos, no combate ao ódio, à intransigência e a radicalizações.
Como Presidente da República, tive a felicidade de nomeá-lo Consultor Geral da República, Ministro da Justiça (lugar que com sua modéstia ainda relutou em aceitar), onde fez excelente trabalho, com a ajuda de sua filha Marta (que herdou do pai qualidades de advogada, inteligência e cultura jurídica) e, finalmente, fazê-lo Ministro do Supremo Tribunal Federal, onde teve uma passagem brilhante, inscrevendo-se na História da Alta Corte como um dos grandes magistrados que ali passaram.
Essa foi sua carreira notável. Mas a característica maior de sua vida foi a do grande defensor da democracia, do lutador pelo Estado de Direito, defensor dos direitos fundamentais do homem, dos valores morais e cívicos, dono de um caráter sem concessões, intransigente em sua conduta pessoal.
Fui seu amigo e até hoje preservo sua memória. Construímos uma amizade pessoal que está incorporada em minha vida. Relembro que, quando voltava a sua terra natal, aposentado por idade do STF, eu o acompanhei ao aeroporto — ele com Dona Lúcia, esposa de grandes virtudes —, entrei no avião, fui até sua cadeira e dei-lhe o abraço de despedida de amigo e grande admirador, amizade que permaneceu com grande afeto até sua morte.
O Rio Grande e o Brasil proclamam no seu centenário que Paulo Brossard foi um exemplo de homem público e um dos maiores políticos, pensadores e juristas do seu tempo.